Muitos são os textos que trazem a educação tecnológica com “salvadora”
da escola (o que já problematizamos várias vezes aqui no BLOG), mas esquecem de
falar sobre os principais atores desta “salvação”: os professores.
A relação entre os professores e a tecnologia – muitas vezes
conflituosa, ou resistente – nos permite (re)pensarmos um pouco mais sobre as
possibilidades que as formas de cooperação poderiam agregar aos processos de
ensino-aprendizagem. Diuturnamente estamos em busca de novos caminhos para os
velhos problemas e é verdade que a tecnologia vem sendo permanentemente
apontada como “luz” neste túnel tão longo e tortuoso, uma vez que ela
possibilita (ao menos, em tese) ações padronizáveis e escalonáveis. Mas também
não é de hoje que vimos defendendo aqui: a tecnologia, por si só (ou qualquer outro
recurso que se crie), não é o ponto “x” da questão; mas sim os possíveis usos,
desusos e abusos que se venham a fazer dela.
No artigo “Tecnologia digital não pode substituir pedagogia”, Vagner de Alencar ressalta que muitos estudiosos entendem que “ao mesmo tempo em que a chamada era digital democratiza a informação,
ela também pode estar desprovida de objetivos formativos, colocando a
informação apenas a serviço do mercado, da publicidade, do consumo”. O autor traz
algumas reflexões de José Carlos Libâneo para corroborar com este debate: “penso
que as características de todo bom professor precisam ser identificadas a
partir de sua base pedagógica. Não são as tecnologias digitais que as definem e
nem apenas as demandas da escola do futuro”. E Libâneo identifica três
características essenciais para a prática do professor: ter sólido conhecimento no seu campo de atuação; saber como ensinar os
conteúdos; e identificar as necessidades individuais de cada estudante. Acrescenta,
então, que é a partir destas características que as tecnologias digitais podem desempenhar
um papel diferenciado na prática docente, pois “elas ajudam a modificar as
formas de aprender dos estudantes, seja definindo novas interações com os
conteúdos, colocando os estudantes nas redes sociais, intervindo nas relações
na sala de aula, entre outros”.
Este nos parece o ponto importante: da mesma forma que desejamos que as
crianças brinquem ao ar livre, também queremos que elas tenham histórias
interativas, criativas e cheias de encantamento em seus tablets; do mesmo modo
que desejamos que os jovens tenham acesso a bons Laboratórios de Ciências e
façam suas descobertas práticas, igualmente queremos que eles possam vivenciar
uma experiência coletiva de resolução de problemas, agindo cooperativamente,
trocando informações em tempo real com outros jovens em diversos lugares do
mundo, de maneira que a soma destes diferentes pontos de vista possa trazer um
resultado mais profícuo para determinada questão. Do mesmo jeito, acreditamos
que os melhores professores muitas vezes têm dificuldade de conseguir perceber
o processo de cada estudante, e ficam restritos aos seus resultados. Claramente
aqui a tecnologia tem hoje inúmeros recursos que possibilitam aos profissionais
saber os caminhos e as hipóteses levantadas pelos educandos e, consequentemente,
auxiliar na criação de estratégias específicas que venham a favorecer seus
processos de produção e de apropriação de conhecimento. Bem, isso para não
entrar em argumentos ligados ao prazer, à ludicidade etc. que a tecnologia pode
ajudar a trazer para as propostas educativas.
Esse assunto também foi abordado por Terry Heick, educador especializado
em desenvolvimento social por meio de inovações no ensino, em entrevista
concedida por e-mail [leia em “Autoaprendizadoe tecnologia: mistura poderosa”].
O autor afirma que cada vez mais
cresce a participação da tecnologia e das
plataformas digitais no ensino formal, destacando os modelos híbridos, com base
no autoaprendizado e na aprendizagem através de jogos e brincadeiras. Enfatiza que, “por meio das brincadeiras, eles [estudantes] são guiados pela
curiosidade, imaginação e pela disposição em relação a algum tema conquistada
por uma autopercepção”. Mas, mesmo nestes casos, Heick
sublinha que o professor tem um papel fundamental nesta interação: “eu
adoraria ver os professores terem completo domínio sobre como as pessoas
aprendem e sobre os inúmeros modelos de aprendizagem disponíveis,
principalmente como resultado da inovação tecnológica”.
Procurando responder à pergunta do título, parece-nos que, no momento
atual, a relação entre professores e tecnologia está marcada por uma espécie de
disputa de espaço e competência – Professor X Tecnologia. E por que isso está assim? Cremos que,
de um lado, as empresas de tecnologia têm constantemente esquecido da
relevância deste sujeito-professor no processo pedagógico; e que tem havido uma
análise equivocada de que a tecnologia vai prescindir deste sujeito (mesma
lógica que defende que os economistas e administradores, sozinhos, vão resolver
as mazelas da Educação no mundo). Por outro lado, também percebemos que muitos
professores têm resistido às mudanças e sentem-se ameaçados por seu não-saber
diante da tecnologia (e de da sapiência de seus estudantes frente à ela!). Nestes
casos, não estariam estes professores esquecendo que justamente o nosso
não-saber é a maior mola propulsora da busca pelo saber?!
Bendito o momento em que esta relação possa se tornar Professor&Tecnologia
– uma via de mão dupla; marcada pela parceira e
cooperação... Todos (sobretudo os estudantes!) sairão ganhando!
Torcemos pelo fim das prepotências, dos olhares com pontos de vista
únicos, das vozes uníssonas... Pelo fim dos medos de não-saber, afinal, nos
ensina a Clarice:
“Eu sei muito pouco. Mas tenho a
meu favor tudo o que não sei e – por ser um campo virgem – está livre de
preconceitos. Tudo o que não sei é minha parte maior e melhor: é a minha
largueza. É com ela que eu compreenderia tudo. Tudo o que eu não sei é que
constitui minha verdade.” – Clarice Lispector
Bom feriado a tod@s! Até semana que vem! Bjs, Bel e Juli
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