O Projeto Político Pedagógico (PPP) de uma
escola reflete sua identidade, isto é, seus modos de ser, agir, pensar e
existir; suas finalidades e metas; objetivos e estratégias. Entendido assim, o
PPP é composto por um conjunto de normas e princípios orientadores de suas
ações cotidianas e, para que possa iluminar fielmente a diversidade de olhares
e vozes da comunidade escolar, sua execução/ revisão deveria acolher a
participação dos seus diferentes atores sociais: pais, crianças, professores,
gestores, funcionários, comunidade circunvizinha. Se o objetivo maior da
instituição escolar é favorecer a aprendizagem significativa das meninas e
meninos que a frequentam, cabe ao PPP debruçar-se sobre estas expectativas de
aprendizagem e traçar meios de as crianças aprenderem com toda a diversidade e
adversidade presentes. Portanto, ao estruturarmos um programa de alfabetização/
letramento temos que ter em mente que a escola não é apartada da vida; e que
sua função não se encerra nela mesma e, assim, nosso desafio como sistema/ rede
de ensino e/ou como escola é sempre sublinhar a importância do conhecimento
para a melhoria da vida dos sujeitos aprendizes.
Neste sentido, infraestrutura, recursos
didáticos e formação de professores são alguns dos aspectos do PPP que merecem
nossa especial atenção, e por isso, vou abordá-los mais detidamente aos poucos
neste BLOG, de maneira separada... Começo, então, pela infraestrutura.
Se, como já mencionado, o PPP da escola deve
traduzir sua identidade, uma vez que a escola assuma o Ciclo da Alfabetização,
ela tem que se preocupar em estruturar e consolidar um ambiente formativo – e este implica, necessariamente, em um espaço
acessível, inclusivo, com oferta quantitativa de material e equipamentos
variados e de qualidade. Entretanto, é importante compreender que o ambiente
formativo de uma escola não se esgota no material específico ofertado, mas
passa pelo espaço físico, sua organização, o mobiliário, os materiais diversos
– tudo isso compõe o ambiente escolar.
Vera Ireland coordenou uma pesquisa pelo MEC/UNESCO, que publicou
em 2007, intitulada Repensando a
escola: um estudo sobre os desafios
de aprender, ler e escrever. Ela foi realizada em 2003 abrangendo todo
território brasileiro, e apontou que as salas de aula não são descritas como
locais atraentes às crianças. Isto ganha importância aqui, pois o Ciclo da
Alfabetização, para ser bem implementado e consolidado, requer a estruturação de
espaços físicos que viabilizem, tanto propostas individuais, quanto em pequenos
e grandes grupos; de espaços que congreguem as diversas identidades infantis
ali presentes, fomentando a percepção de pertencimento nas meninas e meninos da
sala; de espaços que favoreçam o desenvolvimento da expressão autônoma e
autoral de todos os sujeitos nele envolvidos em suas múltiplas linguagens – em outras
palavras: espaços que se constituam em ambientes formativos e acessíveis.
Buscando esmiuçar melhor este trecho supracitado, começo abordando
a questão do espaço em si. Quando focamos na esfera mais específica da
alfabetização/ letramento, é quase senso comum apregoar que a criança deve
estar, desde a mais tenra idade, imersa no mundo
letrado. Mas que seria, afinal, este mundo
letrado ou ambiente alfabetizador?
Logo no início do BLOG, ainda em fevereiro, fiz um post sobre isso...
Lembram?
Quando falo de ambiente alfabetizador, digo de
um espaço que esteja impregnado do material impresso que nos envolve
cotidianamente, explicitando a função social da escrita: desde livros de
literatura, revistas em quadrinhos, jornal e bula de remédio, até painéis de
propaganda, embalagens de produtos, etiquetas de roupas, ou multas de carro...
As palavras e letras, textos em prosa e verso, estão espalhados em diversos
suportes e veículos, e a todo o momento nos provocam, informam, escandalizam,
emocionam, aproximam, entristecem, ensinam... Entre tantas outras possibilidades.
Colocar a criança em estreito contato com o mundo da leitura é ampliar e
qualificar seu acesso a todas as variadas formas de escrita.
E como temos visto isso traduzido nas práticas
pedagógicas? Os espaços escolares estão repletos de mensagens visuais de
caráter educativo/ pedagógico. Quando focamos na perspectiva da alfabetização/
letramento, deparamo-nos com os chamados Alfabetários
e seus derivados: cartazes ou similares que mostram as letras ou encontros
vocálicos, sílabas e palavras, ilustrados, ou não. Entendidos como recurso
pedagógico importante para as crianças em seus processos de apropriação e
produção da escrita, parecem estar incorporados de forma naturalizada às salas de aula. E todo elemento cultural que se quer transformar em natural deve ser aqui problematizado: serão estes alfabetários e
seus derivados instrumentos de apoio, ou de fragmentação de aprendizagem, na
medida em que isolam letras, sílabas, palavras ou encontros vocálicos e os
descontextualizam de sua função social na escrita? Serão os alfabetários e seus
derivados elementos de apoio, ou de reforço à cópia e ao reducionismo
imagético, na medida em que trazem muitas ilustrações marcadamente
estereotipadas, como mostram os exemplos a seguir?
Ou, ainda, será o alfabetário um elemento de apoio, ou veículo de ampliação de vocabulário descontextualizado? Em outras palavras, um cetáceo característico do Círculo Polar Ártico, como o narval, deve ser mote para as crianças aprenderem palavras com a letra "N"?
Estes exemplos acima, de alfabetários e seus
derivados são, em sua maioria, adquiridos pelos professores por “vendedores
ambulantes” que vão às escolas, ou ainda em revistas “educativas” vendidas em
bancas de jornal.
Na realidade, não é o alfabetário por si que é
bom ou ruim; mas, sobretudo, a forma como ele é estruturado e o uso que se faz
dele. Vejamos os exemplos abaixo, de alfabetários construídos coletivamente
através de palavras, imagens, fotos, nomes de meninos e meninas da turma, e
rótulos escolhidos pelas próprias crianças, alunas da EMEF Guido A. Lermen, em
Lajeado (RS)...
... e outro criado a partir dos nomes das meninas e meninos alunos de uma turma da EM Said Albeny, em Coronel Fabriciano (MG), que fizeram seus próprios autoretratos:
A pergunta que se faz pertinente seria: o que
as escolas estão disponibilizando em seus ambientes para ampliar e qualificar o
universo letrado das crianças do Ciclo da Alfabetização?
Na próxima 4f continuamos esta discussão ainda
pela identidade visual das paredes escolares, ok? Aproveitem para dar seus
depoimentos e opiniões sobre esse assunto! =)
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